A experiência trinitária de S. Francisco – Parte 3

São Francisco nos ajuda a superar aquilo que é a maior desventura da teologia cristã: a amnésia da experiência trinitária. Com isso se deixou de colocar como eixo da vida, da Igreja, da sociedade e da compreensão do mundo aquilo que é conteúdo real, escondido sob expressão Trindade: a comunhão, da relação em todas as direções, a troca e a unidade na diversidade. Em seu lugar predominou e continua predominando uma visão monoteísta, da unidade sem a diversidade, da solidão do uno, da piramidalização das relações e da submissão de todos a um único princípio. Perdeu-se o caráter revolucionário presente na fé em Deus-comunhão-de-pessoas, diferentes na unidade e unidas na diversidade. O revolucionário reside na afirmação de que no princípio está a comunhão dos divinos Três e não a solidão do uno.Se assim é, então em tudo deve prevalecer a comunhão, o respeito pelas diferenças e busca da convergência na diversidade. O que vemos na história e nas Igrejas é a prevalência do princípio do centralismo numa única pessoa e na subordinação das demais. Em outras palavras, subjaz a esse tipo de organização o velho monoteísmo pré-trinitário; ele funciona como legitimação ideológica de todos os autoritarismos como bem o formulou Gengis Kahn ao escrever em seu selo: “um só Deus no céu e um só senhor na terra, seu representante, Gengis Kahn”. Uma efetiva fé no Deus-Trindade = comunhão-de-pessoas impossibilitaria semelhantes formulações.À luz desta constatação ressalta como altamente inspirador o que proclamou João Paulo II, na América Latina, em Puebla, no dia 28 de janeiro de 1979, diante da assembléia geral dos bispos do Celam, ao ensinar que a essência íntima de Deus não é a solidão, mas a comunhão, porque Deus é família, é Pai, Filho e Espírito Santo. Estimo que esta afirmação constitui o ponto alto de todo o magistério do Papa Wojtila. Voltemos à experiência de Francisco.

Texto de Frei Vitório Mazzuco, OFM, e Leonardo Boff

Este tema continua amanhã na parte IV

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